segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Frases soltas e (im)pertinentes

Gosto muito de ler em jornais, revistas e livros as citações de grandes mestres pensadores. É claro que, às vezes, nem é preciso ser um intelectual ou grande pensador para que se possa criar tais frases. Em muitos destas ocorrências, aliás, elas podem aparecer até mesmo em parachoques de caminhões e, no caso, tradicionalmente se referem a tiradas populares que sempre vêm com alto teor de humor. A soma destas pérolas espalhadas por todos os cantos do Brasil é conhecida como “filosofia de estrada”.

As citações – também chamadas popularmente de “pensamentos” - nos encantam, nos iluminam e nos levam à reflexão. Se atentarmos bem para seus conteúdos, formas e retóricas, veremos que significam expressões que trazem profundas lições sobre várias áreas da inteligência. Muitas delas, normalmente as melhores, são escritas por filósofos, mas tantas outras podem ser encontradas na verve dos escritores, cineastas, teatrólogos, pintores, artistas, etc.

Eu também me considero um pensador. E, parafraseando os grandes mestres, tratei de ir registrando algumas máximas que criei e escrevi ao longo da vida, que julgo poderem muito bem ser aplicadas em determinados casos, como se poderá ver. Assim, fui desenrolando meu cabedal de conhecimentos e extraindo da maça cinzenta as pérolas que seguem. Espero que elas possam figurar como deleite para alguns, como terapia para outros e até mesmo como lições de vida para terceiros. Eis, então, minhas contribuições para o mundo dos pensamentos.

“Existe um limite para a idiotice, a imbecilidade e a estupidez. Porém, curiosamente alguns seres humanos conseguem extrapolar em muito estas barreiras, alcançando pontos antes nunca atingidos no mundo das inutilidades.”

“Se os seres humanos utilizassem a lógica para determinar qual é a melhor forma de exercer seu comportamento, muitos deles iriam se envergonhar grandemente do que fazem.”

“Muitos indivíduos são tão inúteis, vazios, ignorantes, tolos, arrogantes e completamente atolados em mares de mediocridade, que nada têm a ensinar ou contribuir para com seus semelhantes. Na verdade, nada mais são do que amebas com ridículas pretensões de se tornarem insetos em um futuro remoto e distante.”

“O mais fraterno dos gestos humanos é o abraço, pois ele resulta da única possibilidade em que dois corações ficam o mais próximo possível um do outro.”

“Comentaristas de jogos esportivos são aqueles indivíduos que querem arranjar um jeito de fazer com que os dois times em campo ganhem a partida.”

“As pessoas, de um modo geral, falam muito bem dos esportes, que são as coisas mais perfeitas e aconselháveis do mundo e que todos deveriam praticar. Mas existe uma coisa que me deixa profundamente intrigado: se há um jogo em que um tem de necessariamente ganhar e o outro tem de necessariamente perder, isso não pode em hipótese alguma ser considerado como sendo uma coisa boa e recomendável. Assim, só existem coisas boas e recomendáveis quando todos ganham e ninguém perde.”

“Quando vejo dois boxeadores se batendo num ringue, com as manchas das pancadas espalhadas pelo rosto e sangue jorrando por todos os lados, tenho a exata noção de que o ser humano chegou, finalmente, à mais baixa e desprezível condição humana.”

“Aquelas cenas em que os toureiros, depois de humilharem o touro com aquelas roupas ridículas e gestos afeminados, perpetram suas espadas, uma a uma, até matar o animal, deveriam ocorrer ao contrário: ou seja, de tão estúpidas que são os bois é que deveriam montar nos toureiros e depois atolar as espadas no coração dos seus algozes.”

“As pessoas que saem às ruas, praças e logradouros com seus cachorros, para que estes possam fazer suas necessidades físiológicas em áreas públicas – porque não querem que eles o façam em suas casas -, deveriam sofrer as seguintes penalidades: recolher os dejetos do animal, limpar o lugar deixando-o exatamente como estava, pagar uma multa de cinco mil reais em vinte e quatro horas e ser levado de camburão para passar uma temporada de seis meses na cadeia.”

sábado, 4 de setembro de 2010

Abertura do Show "Trem Sentimental"

Eis aqui o texto de abertura que escrevi e li para o show "Trem Sentimental", ao lado de grandes e talentosos músicos de Araçatuba.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

A gente vai estar estando...

Sabe c’umé, né? Valeu, cara! Pimba na gorduchinha! Sacou, mano? Chique no úrtimo...A gente vai tá fazendo.. Analisando esta sequência insólita de modismos e banalidades que assolam a estrutura da nossa bela língua portuguesa só faltou o aperfeiçoamento e progressão naturais da Nova Inteligência que adotará a frase “a gente vai estar estando...”. Mas pelo andar da carruagem vamos chegar a isso e em muito menos tempo do que pensamos.

Meus Deus, o que fizeram com a última flor do Lácio, o nosso idioma de todos os romances, poesias, belezas e encantamentos? Que destino cruel decretaram para a língua de Camões, Machado de Assis, Clarice Lispector, Guimarães Rosa, Rachel de Queirós e tantos outros mestres na arte de escrever?

Confesso que ando amedrontado com o que leio e ouço das pessoas, principalmente quando estão se comunicando de maneira informal, livre e solta. Parece que foi instalada de vez a ditadura da pobreza educacional e da mediocridade intelectual.

Excetuando-se as escolas, revistas, jornais, outras formas de mídia respeitáveis e as instâncias onde o rigor gramatical precisa ser observado, porque é fonte de aprendizado, cultura e identidade – e exatamente por isso se transformam nos últimos bastiões da integridade de nossa língua -, o que resta e se nota é algo de estarrecer até os mais incultos dos seres falantes.

O empobrecimento da fala e da escrita é uma realidade inconteste. Às vezes, por mais que se tente ler e entender o que algumas pessoas querem dizer quando escrevem ou falam, mais chegamos à conclusão de que a língua utilizada neste “esforço” não é o idioma português. O despreparo é flagrante e o desconhecimento de regras elementares de gramática, principalmente concordâncias e regências, simplesmente vexatório.

As pérolas reunidas em programas de humor sobre o que os alunos escrevem em vestibulares são incríveis. E, neste caso, não se revela apenas o fato de que alguém não sabe escrever ou falar, mas o de não fazer a menor ideia sobre pontos e matérias cujo teor, contexto e conteúdo os estudantes deveriam dominar quando aspiraram a graus superiores de ensino.

Ao que tudo indica, parece estar ocorrendo um devastador processo de avacalhação de conhecimento, imposto por novos e infames costumes, que vem se instalando e, paulatinamente, ceifando as últimas fronteiras do que seria o lógico e o minimamente aceitável. Os meios de comunicação de massa e os modismos se encarregam de a cada dia criar neologismos, a maioria sem utilidade e sem sentido. Os jovens adotam e introduzem gírias criando seu próprio dialeto e o internetês se transformou em uma espécie de língua paralela, porém entendido como sendo uma vertente de nosso idioma, o que é mais desolador.

O que se percebe é que novos termos e expressões são introduzidos e ficam valendo no processo de comunicação. A isso se soma a preocupação de que, segundo estatísticas, o universo vocabular médio e geral de uma pessoa comum, no Brasil, gira em torno de 300 palavras. Ou seja, um cidadão brasileiro usa para sua comunicação no trabalho, na família, no seu círculo de amizades e na sociedade algo próximo de apenas 300 palavras.

A culpa nem é das escolas e dos professores que trabalham nas primeiras fases do aprendizado, pois nestas instituições ainda existem aqueles que se dedicam ao ensino com responsabilidade, procurando transmitir aos alunos a importância daquilo que ensinam. Até porque não se pode admitir que diante de uma classe de alunos não haja um docente preparado, conhecedor de sua profissão. O problema está mais no aluno, por conta dos vícios que ele adquire fora da escola e dos modismos e posturas inconsequentes que adota no seu dia a dia.

Deve-se enaltecer e levar em conta, é claro, as manifestações de interesse de pessoas ávidas por aprender e por buscar alternativas através das quais possa ir assimilando novos ensinamentos. Isso se dá, por exemplo, através da leitura de bons textos, como aqueles dos bons romances, das belas e perfeitas poesias, das excelentes reportagens em revistas e jornais de credibilidade. Ou seja, o estudante não deve depender só da escola para aprender, pois grande parte de suas conquistas precisa vir de sua vontade própria, de sua sede pelo saber, de sua curiosidade e de seu desejo de crescer intelectualmente.

A situação no trato do nosso idioma é tão grave que há algum tempo o ex-governador do Distrito Federal, não contente com as respostas frequentes de seus colaboradores, que às suas indagações e questionamentos lhe respondiam sempre com um invariável “estamos providenciando”, demitiu sumariamente a figura do gerúndio. Provavelmente, o que o governador, ele próprio desorientado e pouco apegado ao intelecto, queria mesmo era defenestrar o gerundismo, este sim uma praga crônica da atualidade, em que os desavisados falam coisas do tipo “a gente vai tá fazendo...”

A rigor, o gerúndio é um tempo verbal legítimo que utilizado de forma correta e adequada é perfeitamente legal. Mas a pergunta que não quer calar é: e agora, o que mais virá por aí em termos de sandices, imbecilidades, idiotices, vulgaridades e babaquices?

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Eu, Pernilongo; você, meu sangue...


É amigos, sou esta celebridade que acumula cada vez mais fama em todo o Brasil, quiçá no mundo, e que inferniza a sua vida e a de todos os seus semelhantes. Sei que você é um ser humano honesto, esforçado e dá literalmente o seu sangue para conseguir o seu sustento e o de seus entes queridos. Eu, entretanto, confesso que sou um ser altamente dependente, um chupim na sua forma mais clássica, um verdadeiro sanguessuga que precisa dos outros para sobreviver. Assim, concordo que não tenho nenhum mérito ou valor, porque não produzo nada de interessante; muito pelo contrário, provoco um flagelo entre vocês, pessoas de ambos os sexos e idades.
Talvez você nem conheça algumas particularidades a meu respeito. Por exemplo, que aquela que te pica, ou seja, eu, sou do gênero feminino. É isso mesmo: sou fêmea e, a exemplo das leoas que saem para a busca do sustento da família, cabe a mim a tarefa diária de sugar o seu sangue, me manter viva e criar a minha prole, garantindo assim a perpetuação da minha espécie. E não pense que isso é fácil de fazer. Tenho, é claro, a facilidade e felicidade de não precisar escolher as minhas vítimas, porque sangue é sangue em qualquer situação. Todavia, obtê-lo não é um trabalho “moleza”, como se poderia considerar à primeira vista. Preciso, antes, adotar uma série de procedimentos de forma a ter sucesso em minhas empreitadas.
Assim, o primeiro passo é escolher um lugar bom de seu corpo, preferencialmente onde você não me veja, aproveitar o fato de você estar distraído, aplicar uma espécie de “anestesia” – para você não sentir o baque e não querer ficar me incomodando - até porque eu gosto de sugar os outros em paz – e introduzir um recurso físico que eu tenho e que se parece muito com o ferrão das abelhas. Você pensa que é simples ferrar você profundamente, ou seja, ir fundo com meu comprido bico até alcançar as camadas mais ricas de seu pré-sal, quero dizer, pré-sangue?
Outra coisa: para mim também não é nada fácil ter de ficar dando aqueles goles contínuos e intensos, de forma a ir subtraindo o “precioso líquido vermelho” de seu corpo e ir depositando-o em minhas entranhas. Na verdade, este esforço é bastante extenuante. E fique sabendo que depois de finalizado o meu trabalho eu só voo lentamente e “pesadona” porque consumi uma energia imensa picando e ferrando você, e não porque meu estômago está cheio do seu delicioso sangue.
Confesso também que o meu companheiro, o meu “homem”, ou macho – como vocês chamam – é um ser inútil e praticamente um desocupado. Não é ele que vai à luta para obter o sangue nosso de cada dia. Na verdade, é um sujeito simplório e preguiçoso que se contenta em consumir gravetos, folhagens e outras coisas menos nobres que nem de perto têm o sabor sublime, nutricional e altamente reconfortante do sangue humano. Quer dizer: meu marido é tão chulo que nem sabe escolher uma boa bebida.
Outra coisa que eu percebo é que os humanos mais perdem tempo em achar um nome para a minha espécie do que efetivamente em me combater e me exterminar. Assim, vivem arrumando umas palavras em latim, uma língua já morta e que ninguém mais entende, criando classificações estranhas. Vejam quantas coisas vocês escrevem só para me identificar: que sou do reino Animália, da filo Arthropoda, da classe Insecta, da ordem Díptera, da subordem Nematocera, da família Culicidae, da subfamília Culicinae, do gênero Aedes, do sub-gênero Stegomyia e da espécie Aedes Aegypti. Mas dizem, também, que sou conhecido como, aí sim, pernilongo – meu verdadeiro nome, aliás, obrigado! - muriçocas ou carapanãs. Se isto não bastasse, deram até um título para os estragos que eu consigo fazer, esse palavrão chamado dengue. Pode?
E mais, meu amigo: de boba eu não tenho nada. Pensa que eu não fico à espreita para saber onde você deixou descuidadamente aquele restinho de água, em um vaso, na planta, nas calhas da sua casa, nos pneus, em qualquer lugar onde eu possa exercer a maravilhosa arte da procriação? Saiba que me basta só um pouquinho dela – bem limpinha e arejada, de preferência, porque sou altamente seletiva – para eu depositar meus lindos ovinhos e daí a alguns dias dar vida aos meus pequeninos. Afinal, eles são seres vivos que também querem ter um lugar ao sol.
Vocês até tentam me intimidar jogando para cima de mim uma fumaça horrível, mas, cá pra nós, já percebi que ela tem mais cheiro do que eficácia. Quando meus algozes vêm, prendo a respiração e vou para outro lugar. No fundo no fundo, eu até considero você um grande aliado meu, porque não vive querendo acabar com o acúmulo de água aqui ou ali, dificultando a minha vida e me impedindo de dar à luz. Infelizmente, não posso agradecer você de outra forma por esta grande deferência, a não ser estar sempre direcionando o meu longo bico para as partes mais frágeis do seu corpo e fazendo-o perder alguns gramas do sagrado líquido que me mantém viva e atuante.